Diário Granma – Terra Sen Amos
Em carta dirigida a Obama dende diario Granma de 28.03, Fidel Castro recorda auséncias em discurso pronunciado pelo primeiro presidente negro dos EUA na Habana: “Não disse que a discriminação racial foi varrida pela Revolução; que a aposentadoria e o salário de todos os cubanos foram decretados pela Revolução antes de o senhor Obama completar dez anos; que o odioso costume burguês de contratar esbirros para expulsar cidadãos negros de centros de lazer foi varrido pela Revolução Cubana”. O Líder da Revolução consagra um extenso parágrafo a batalha travada por Cuba em Angola contra o apartheid, resultante no fim “da presença de armas nucleares em um continente de mais de um bilhão de habitantes. Esse não era o objetivo de nossa solidariedade mas sim o de ajudar aos povos de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e outros da dominação colonial fascista de Portugal”. Citando o ofereçemento de paz e ajuda de Obama, Fidel replica: “Não precisamos que o império nos entregue nada de presente. Nosos esforços serão legais e pacíficos, porque é nosso compromisso com a paz e a fraternidade de todos os seres humanos que vivemos neste planeta, Somos capazes de produzir os alimentos e as riquezas espirituais de que precisamos, com o esforço e a inteligência de nosso povo”. (A seguir, texto completo da carta de Fidel, titulada “Ao Irmão Obama”)
OS reis da Espanha trouxeram-nos conquistadores e donos, cujas pegadas ficaram gravadas nos terrenos circulares atribuídos aos buscadores de ouro na areia dos rios, uma forma abusiva e vergonhenta de exploração cujos sinais ainda hoje podem ser advertidos, do ar, em muitos lugares do país.
O turismo hoje, em boa parte, consiste em mostrar as delícias das paisagens e degustar os alimentos requintados de nossos mares, e sempre que sejam compartilhados com o capital privado das megacorporações estrangeiras, cujos ganhos se não atingem bilhões de dólares não são dignos de atenção alguma.
Já que fui obrigado a mencionar o tema devo acrescentar, principalmente para a moçidade, que poucas pessoas percebem a importância de tal condição neste momento singular da história humana. Não direi que o tempo tenha sido perdido, mas não vacilo ao afirmar que não estamos suficientemente informados, nem vocês nem nós, dos conhecimentos e da consciência que deveríamos ter para enfrentar as realidades que nos desafiam. O primeiro a ser levado em conta é que nossas vidas são uma fração histórica de segundos, a qual é preciso compartilhar, ainda, com as necessidades vitais de todo ser humano. Uma das características deste é a tendência à sobrevalorização do seu papel, questão que contrasta, por outro lado, com o número extraordinário de pessoas que encarnam os sonhos mais elevados.
Ninguém, contudo, é bom ou é mau por si próprio. Nenhum de nós está desenhado para o papel que deve assumir na sociedade revolucionária. Em parte, nós os cubanos tivemos o privilégio de contar com o exemplo de José Martí. Pergunto, inclusive, se ele devia ter morrido ou não em Dos Rios, quando disse “para mim está na hora”, e avançou contra as forças espanholas entrincheiradas em uma sólida linha de defesa. Não queria retornar para os Estados Unidos e não haveria quem o fizesse retornar. Alguém tirou algumas folhas do seu diário. Quem arcou com essa pérfida culpa, que foi, sem dúvida, obra de algum intrigante inescrupuloso? Soube-se que existiam diferenças entre os chefes, porém jamais houve indisciplinas. “Quem tente apropriar-se de Cuba colherá o pó do seu solo alagado em sangue, se antes não perece na luta”, declarou o glorioso líder negro Antonio Maceo. Reconhece-se, igualmente, que Máximo Gómez foi o chefe militar mais disciplinado e discreto de nossa história.
Olhando de outro ângulo, como a gente não vai ficar admirada da indignação de Bonifacio Byrne quando, da distante embarcação que o trazia de retorno a Cuba, ao divisar outra bandeira junto da da estrela solitária, declarou: “Minha bandeira é aquela que jamais tem sido mercenária…” para acrescentar imediatamente uma das frases mais belas que jamais escutei: “Se desfeita em miúdos pedaços chega a estar minha bandeira algum dia… nosso mortos, erguendo os braços, ainda saberão defendê-la…” Tampouco esquecerei as palavras ardentes de Camilo Cienfuegos naquela noite, quando a várias dezenas de metros de nós, bazucas e metralhadoras de origem norte-americana nas mãos de agentes contrarrevolucionários apontavam para nós. Obama tinha nascido em 1961, como ele próprio explicou. Mais de meio século decorreria desde aquele momento.
Contudo, vejamos como pensa nosso ilustre visitante:
“Vim aqui para deixar atrás os últimos sinais da guerra fria nas Américas. Vim aqui estendendo a mão de amizade ao povo cubano”. E imediatamente um dilúvio de conceitos, inteiramente novos para a maioria de nós:
“Ambos vivemos em um novo mundo que foi colonizado pelos europeus”. Prosseguiu o presidente norte-americano. “Cuba, tal como os Estados Unidos, foi constituída por escravos trazidos da África; tal como os Estados Unidos, o povo cubano tem herança de escravos e de donos de escravos”.
As populações nativas não existem para nada na mente de Obama. Tampouco disse que a discriminação racial foi varrida pela Revolução; que a aposentadoria e o salário de todos os cubanos foram decretados por esta antes de o senhor Obama completar dez anos. O odioso costume burguês de contratar esbirros para expulsar cidadãos negros de centros de lazer foi varrido pela Revolução Cubana. Esta ficaria gravada na história pela batalha que travou em Angola contra o apartheid, pondo fim à presença de armas nucleares em um continente de mais de um bilhão de habitantes. Esse não era o objetivo de nossa solidariedade mas sim o de ajudar aos povos de angola, Moçambique, Guiné-Bissau e outros da dominação colonial fascista de Portugal.
Em 1961, apenas um ano e três meses depois do triunfo da Revolução, uma força mercenária com canhões e infantaria blindada e com aviões foi treinada e acompanhada de navios de guerra e porta-aviões dos Estados Unidos e atacou de surpresa nosso país. Nada poderá justificar aquele aleivoso ataque que custou ao nosso país centenas de vidas, entre mortos e feridos. Da brigada de assalto pró-ianque, em nenhuma parte consta que tivesse podido ser evacuado nenhum mercenário. Aviões ianques de combate foram apresentados nas Nações Unidas como aparelhos cubanos revoltados.
É bem conhecida a experiência militar e o poderio desse país. Na África pensaram igualmente que a Cuba revolucionária seria igualmente posta fora de combate. O ataque pelo Sul de Angola por parte das brigadas motorizadas da África do Sul racista levou-as até as proximidades de Luanda, a capital desse país. Aí se iniciou a luta que se prolongaria não menos de 15 anos. Nem sequer falaria disto a menos que tivesse o dever elementar de contestar o discurso de Obama no Grande Teatro de Havana Alicia Alonso.
Tampouco tentarei dar detalhes, a não ser que ali foi escrita uma página de honra na luta pela libertação do ser humano. De certa forma eu desejava que a conduta de Obama fosse correta. Sua origem humilde e sua inteligência natural eram evidentes. Mandela ficou preso a vida toda e se tinha convertido em um gigante da luta pela dignidade humana. Um dia chegou às minhas mãos uma cópia do livro no qual se conta uma parte da vida de Mandela e, surpresa!, o prólogo tinha sido escrito por Barack Obama. Folhei-o rapidamente. Era incrível o tamanho da minúscula letra de Mandela precisando dados. Vale a pena ter conhecido homens como aquele.
Acerca do episódio da África do Sul devo assinalar outra experiência. Eu estava realmente interessado em conhecer mais detalhes sobre a forma em que os sul-africanos tinham adquirido as armas nucleares. Somente tinha a informação muito precisa de que não eram mais de 10 bombas. Uma fonte certa seria o professor e investigador Pero Gleijeses, quem tinha redigido o texto “Missões em conflito: Havana, Washington e África 1959-1976”; um trabalho excelente. Eu sabia que ele era a fonte mais segura do que tinha acontecido e assim o comuniquei a ele: respondeu-me que ele não tinha falado mais do assunto, porque no texto tinha respondido as perguntas do companheiro Jorge Risquet, quem tinha sido embaixador ou colaborador cubano em Angola, muito amigo dele. Localizei Risquet que, entre outras ocupações, estava acabando um curso ao que faltavam ainda várias semanas. Essa tarefa coincidiu com uma viagem bastante recente de Piero ao nosso país; eu tinha advertido a Piero que Risquet já tinha uma idade avançada e que sua saúde não era ótima. Poucos dias depois ocorreu o que eu estava temendo: Risquet piorou e faleceu. Quando Piero chegou, não havia nada a fazer exceto promessas, mas eu já tinha conseguido informação acerca do relativo a essa arma e a ajuda que a África do Sul racista tinha recebido de Reagan e de Israel.
Não sei o que terá de dizer Obama sobre esta história. Desconheço o que ele sabia ou não, embora seja muito duvidoso que não soubesse absolutamente nada. Minha modesta sugestão é que reflita e não tente agora elaborar teorias sobre a política cubana.
Há uma questão importante:
Obama proferiu um discurso no qual lança mão de palavras mais adocicadas para expressar: “Já é hora de esquecer-nos do passado, deixemos o passado, olhemos para o futuro, olhemos juntos o futuro, um futuro de esperança. E não vai ser fácil, vai haver desafios e a esses vamos dar tempo; mas minha estadia aqui me dá mais esperanças acerca do que podemos fazer juntos como amigos, como família, como vizinhos, juntos”.
Supõe-se que cada um de nós corria o perigo de sofrer um infarto após escutar essas palavras do presidente dos Estados Unidos. Após um bloqueio desapiedado que já durou quase 60 anos, e aqueles que morreram nos ataques mercenários a navios e portos cubanos, um avião regular cheio de passageiros feito explodir em pleno vôo, invasões mercenárias, múltiplos atos e violência e de força?
Ninguém acalente a ilusão de que o povo deste nobre e abnegado país renunciará à glória e os direitos e à riqueza espiritual que ganhou com o desenvolvimento da educação, a ciência e a cultura.
Advirto, ademais, que somos capazes de produzir os alimentos e as riquezas espirituais de que precisamos com o esforço e a inteligência de nosso povo. Não necessitamos que o império nos entregue de presente nada. Nossos esforços serão legais e pacíficos, porque é nosso compromisso com a paz e a fraternidade de todos os seres humanos que vivemos neste planeta.